domingo, 25 de novembro de 2012

A política de cotas nas Universidades.



Durante os últimos meses a questão das cotas sociais e raciais nas universidades públicas brasileiras tem ocupado inúmeras discussões e postagens nas redes sociais, sobretudo o facebook. Tais posts se intensificaram em razão da atuação do ministro do STF, Joaquim Barbosa, no julgamento do mensalão. Deste modo, esse texto é uma tentativa de posicionamento e contribuição para um debate que necessariamente precisa ser feito no Brasil de forma ampla e profunda. Em razão disso, não há aqui qualquer pretensão de esgotamento do assunto ou mesmo de estabelecimento de uma posição rígida e inamovível em relação ao problema posto.
Na rede social há diversas apropriações da figura do ministro Joaquim Barbosa que, apesar da diversidade de abordagens, dizem respeito a um discurso comum que parte de um lugar social específico. Em sua maioria, as postagens abordam a luta de Barbosa contra a corrupção e o mérito do ministro que, tendo superado o racismo e a pobreza, alcançou um dos cargos mais importantes no judiciário brasileiro. Assim, por trás dessas imagens, há a reprodução de uma espécie de lógica da meritocracia. Nessa lógica, fundamentada pelo individualismo liberal, o indivíduo é responsável por sua condição no mundo, de modo que sua pobreza ou riqueza é resultado exclusivo de seus méritos ao longo da vida. Portanto, se Joaquim Barbosa se encontra hoje à frente do STF isso se deve exclusivamente à seus méritos.
Obviamente, não estamos aqui questionamento a capacidade e o esforço de Barbosa em sua trajetória jurídica; o que estamos questionamento aqui é a universalização da trajetória de Joaquim Barbosa, que é operada pelo discurso das classes médias, amplamente fundamentado na lógica da meritocracia e em um liberalismo conservador à brasileira. Assim, nessa ótica, se Barbosa conseguiu o que conseguiu, apesar de suas condições, qualquer um, com o mesmo esforço, poderá também conseguir. Portanto, um caso de alguém que conseguiu transformar suas condições de vida é alçado à condição de regra.
O problema não é o mérito em si, mas a sociedade em que se propõe o discurso da meritocracia, uma vez que esse discurso termina por camuflar a desigualdade de condições existentes na sociedade brasileira, bem como os limites no mercado de trabalho. É, portanto, nessa questão das desigualdades que entra a proposta das cotas pelo governo federal.
A proposta das cotas logo de início denota o reconhecimento por parte do Estado das desigualdades sociais existentes no Brasil e da situação terrível em que se encontra a educação pública no país. Deste modo, a política de cotas é uma tentativa de equacionar as desigualdades sociais, e inclusive raciais. No entanto, por si mesma, a política de cotas é insuficiente no equacionamento dessas desigualdades. A proposta atual não visa uma transformação do ensino público brasileiro, tampouco procura diminuir as desigualdades sociais. Nesse sentido, caso se decida pela manutenção do sistema de cotas sociais no Brasil, este deve ser implantado em conjunto com outras medidas que visem a melhora da educação pública, de modo que dentro de determinado tempo, o sistema de cotas se mostre desnecessário e anacrônico.
Por outro lado, não consigo manter uma posição maniqueísta, mantendo-me completamente contra ou completamente a favor das cotas. De algum modo, o sistema de cotas colocará dentro da universidade pública grupos sociais que provavelmente não ingressariam na universidade, conferindo, assim, oportunidades de ascensão social à essas pessoas. No entanto, ainda que tais grupos ingressem na universidade, a origem das desigualdades ainda será mantida.
Diante desse ingresso das classes trabalhadoras na Universidade, outras questões se impõem: qual a base de conhecimento que o aluno ingressante por meio das cotas possui para a continuidade de seus estudos na universidade, visto que o próprio Estado assume a deficiência da educação oferecida? Haverá discriminação por parte dos alunos não-cotistas em relação aos cotistas?
No momento não possuo quaisquer respostas para tais pergunta. Meu intuito aqui foi apenas o de problematizar determinadas questões, de modo bastante superficial, buscando oferecer uma mínima contribuição para um debate imenso.

2 comentários:

  1. Excelente meu amigo. Embora eu me posicione contra, concordo plenamente com o seu posicionamento. Nem sabia que você andava escrevendo. Muito bom mesmo! Mas acredito que a solução não existe de forma imediata, como propõe o sistema de cotas. Isso é impossível na minha opinião. Acredito que o caminho correto seria o investimento MACIÇO em educação pública básica, pois seria a única maneira de todos termos condições de igualdade em uma disputa de vaga em universidades federais.

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  2. Marcus , realmente a questão da meritcracia em nosso país é muito peculiar , uma vez que carregamos em nossa herança o fardo do Homem Cordial (tornando nossa meritocracia mais uma questão de indicação do que de esforço). Não só isso , concordo plenamento quando você diz "outro lado, não consigo manter uma posição maniqueísta, mantendo-me completamente contra ou completamente a favor das cotas." . Como ser contra algo que abre um leque de oportunidades para aqueles que nunca são favorecidos em nossa sociedade ? Por outra lado , cotas não resolvem o problema da educação do nosso país ! Acho que uma revolução na educação pública deve ser feita , uma vez que é assegurado por lei "ensino de qualidade" , não canso de citar exemplos de paises que investiram todos os recursos na educação e hoje são mundialmente reconhecidos. Acredito que esse ciclo vicioso onde, o Estado não investe na educação de seu povo , e o povo , por justamente não ter recursos e nem capacidade critica que exigir/lutar por seus direitos , deve ser quebrado e com urgencia ! Entenda , não quero colocar aqui uma questão partidaria/politica, mas sim de exigir os direitos que nós é assegurado por lei, e que apenas uma pequena parcela tem conhecimento e o pior , sabe o quanto a educação é capaz de transformar uma nação. Enfim , espero aqueles que postam no facebook Joaquim barbosa se vangloriando se ter ascendido social e economicamente por ele mesmo , percebam também que , a meritocracia tem sua importancia , quando todos tem verdadeiramente condições iguais de competção.

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